Os defensores da dieta raw food, ou dieta à base de alimentos crus, encaram este padrão alimentar como parte de um estilo de vida saudável, estando habitualmente associado a comportamentos protetores de saúde, como a prática regular de atividade física e a abstinência de bebidas alcoólicas e de tabaco. Contudo, dada a restrição alimentar, por vezes severa, inerente a esta dieta, existe risco de desnutrição, decorrente de uma ingestão insuficiente em energia e em nutrientes, com consequentes efeitos negativos para a saúde. A dieta raw food consiste na ingestão predominante ou exclusiva de alimentos crus e minimamente processados. São, na sua maioria, dietas vegan ou vegetarianas estritas, contudo existem variantes que incluem alimentos de origem animal, podendo ser classificadas de dietas raw food vegetarianas (com introdução de ovos e lacticínios) ou dietas raw food omnívoras (com introdução de ovos, lacticínios, carne e pescado). Apesar da ausência de consenso, alguns defensores da dieta raw food indicam que um padrão alimentar pode ser considerado raw, desde que, pelo menos 75% da quantidade de alimentos ingeridos sejam alimentos crus. Na definição de alimentos crus, entram todos aqueles que não tenha sido submetidos a temperaturas acima dos 48ºC, podendo entrar alimentos prensados a frio (ex.: óleos vegetais), desidratados (ex.: frutas, vegetais, alguns frutos secos), curados a frio (ex.: carne, peixe) e fermentados (ex.: vegetais). Em termos históricos, a dieta raw food tem a sua origem mais recente nos séculos XIX e XX, com o surgimento de movimentos de defesa de uma alimentação vegetariana estrita, à base de alimentos crus, como parte de um estilo de vida saudável e promotor de longevidade. Os alimentos a serem consumidos deveriam encontrar-se no seu estado mais natural possível, evitando qualquer tipo de confeção ou de processamento. Os defensores argumentavam que o ato de cozinhar os alimentos destruía nutrientes vitais e que os alimentos cozinhados eram tóxicos para o organismo. Mais recentemente, nos anos 80, surgiu o programa Fit-for-Life, desenvolvido por Marilyn e Harvey Diamond, que se baseia predominantemente numa dieta raw food vegan e que se encontra direcionado para a perda de peso. Nesta versão da dieta raw food, os alimentos são categorizados em dois grupos: os alimentos “vivos”, cujo consumo é incentivado, e os alimentos “mortos”, como a carne, peixe, lacticínios, cereais e leguminosas, que devem ser excluídos. Para além disso, defende que a ingestão alimentar deve seguir alguns princípios, ausentes de evidência científica, no que diz respeito à combinação de alimentos e à altura do dia em que determinados alimentos devem ser ingeridos. A dieta raw food baseia-se assim na ingestão maioritária de alimentos crus não processados, como fruta, hortícolas, frutos oleaginosos, sementes e rebentos de cereais e de leguminosas, existindo variações com a introdução de alimentos de origem animal. Tem como base a crença de que alimentos crus são mais nutritivos que os alimentos cozinhados. Em alternativa à confeção por ação do calor, são utilizados outros métodos de preparação de alimentos como a desidratação, a demolha e a germinação. Assim, com este regime alimentar, ocorre uma elevada ingestão de alimentos de origem vegetal, que se encontram a associados benefícios para a saúde, pelo seu conteúdo em fibra, vitaminas, minerais e em compostos com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. Com a ausência de confeção pelo calor, o conteúdo em nutrientes que seria reduzido pela exposição a temperaturas elevadas será mantido. Apesar dos aspetos positivos indicados, os riscos inerentes à adoção deste regime alimentar sobrepõem-se aos seus potenciais benefícios. Dada a elevada restrição alimentar associada à dieta raw food, existe risco de ocorrência de carências nutricionais, tanto em macro como em micronutrientes. Num estudo realizado em indivíduos que seguiam uma dieta raw food (Koebnick et al, 1999), verificou-se que 15% e 25% dos indivíduos de sexo masculino e sexo feminino, respetivamente, apresentavam baixo peso (IMC<18,5 Kg/m2), tendo sido determinado um risco de desnutrição três vezes superior em indivíduos que consumiam 100% de alimentos crus e duas vezes superior em indivíduos que consumiam 95 a 99% de alimentos crus, em comparação com indivíduos que consumiam menos de 80% de alimentos crus. Estes resultados rementem para um aporte calórico insuficiente em indivíduos que seguem uma alimentação raw food mais estrita. Constatou-se ainda que, na fase inicial da adoção de uma dieta raw food, tende a ocorrer uma elevada redução de peso; posteriormente ocorre uma estabilização do peso, contudo este tende a manter-se abaixo do peso inicial. A perda de peso tende a ser maior, quanto maior for a percentagem de alimentos crus consumidos. Verificou-se ainda, nas mulheres, um aumento do risco de amenorreia (ausência de menstruação) com a adoção de uma dieta raw food estrita, decorrente de uma ingestão calórica e nutricional deficitária. Na realidade, o ato de cozinhar os alimentos traz benefícios ao processo de digestão e de absorção de nutrientes. A exposição de alimentos de origem animal e vegetal ao calor da confeção tem um efeito de pré-digestão, facilitando os processos de mastigação, de atuação das enzimas digestivas e de absorção de nutrientes, contribuindo, por um lado, para ganhos em energia/calorias e, por outro, para a redução dos gastos energéticos inerentes aos processos digestivos. Para além disso, existem nutrientes em que a confeção pelo calor aumenta a sua biodisponibilidade, como é o caso do licopeno e do beta-caroteno. Por outro lado, cozinhar os alimentos, tal como os processos de demolha, de germinação ou de fermentação de alimentos, ajuda na eliminação de substâncias denominadas de anti-nutrientes. Os anti-nutrientes são substâncias que ocorrem naturalmente nos alimentos e que podem interferir com a absorção de nutrientes. São exemplos de anti-nutrientes, os oxalatos (presentes nos espinafres, beterraba, cacau), os fitatos (presentes nas leguminosas, nos frutos oleaginosos, nos cereais, nas sementes), as lectinas (presentes nas leguminosas, nos cereais) e a saponinas (presentes nas leguminosas, na quinoa). Importa ainda referir que a exposição dos alimentos a temperaturas elevadas contribui para a eliminação de microrganismos potencialmente causadores de toxinfeções alimentares. Este aspeto é particularmente importante em alimentos de origem animal, em que a aplicação de tratamentos térmicos, como a confeção ou a pasteurização, contribuem para a redução e mesmo eliminação de microrganismos causadores de doença. Desta forma, a adoção de uma dieta raw food estrita